segunda-feira, 25 de maio de 2015

Maluquices etimológicas

Esse tal de Castro Lopes deve ser a inspiração do Aldo Rebelo.

Da Veja:

O latinista Castro Lopes sacode os literatos ao criar palavras que substituam galicismos

É possível que o leitor esteja lendo esta revista agora em sua cama, com a ajuda de seus nasóculos e à luz suave de um lucivelo. Os artigos escritos pelos alvissareiros misturam-se, harmoniosamente, aos preconícios que louvam as virtudes de sortidos produtos. Faz calor neste final de primavera, e decerto o nosso leitor não retira há muito tempo de sua gaveta o focale que lhe aquece o pescoço no frio. E ele provavelmente terá reparado como é grande, nos últimos tempos, o número de ludâmbulos que, vindos de outros Estados e até de outros países, se abalam a conhecer os encantos da cidade.

Não te sintas o mais ignaro dos brasileiros se, no parágrafo anterior, tropeçaste em vocábulos como “nasóculos”, “Iucivelo”, “alvissareiro”, “preconício”, “focale” e “ludâmbulos”. Consultados sobre o significado de tais palavras, dez em cada nove jornalistas desta revista que ora tens em mãos - dez em nove, repara - tropeçaram exatamente onde foste ao chão. Um, mais curioso, tratou de correr ao Caldas Aulete, mas foi inútil. Cerrou as páginas do dicionário tão no ar quanto as abrira. É que todas aquelas palavras acabam de ser criadas pelo gramático carioca Antônio de Castro Lopes, 62 anos, um latinista de nomeada que é médico por profissão e decidiu investir contra os galicismos e anglicismos que, a seu ver, contaminaram atrozmente a língua pátria. As palavras a que Castro Lopes tenta dar vida e aquelas que ele pretende suprimir estão arroladas no recém-lançado Neologismos Indispensáveis e Barbarismos Dispensáveis, livro que serviu de tema para conversas, e piadas, trocadas entre o ex-imperador Pedro II e o Visconde de Taunay.

“Não é de desenterrar palavras mortas e sepultadas que se trata”, explica o autor no prefácio do opúsculo. “Mas de limpar, de expurgar a linguagem vernácula de vozes bárbaras, de construções contrárias à índole daquela, e de criar com bons elementos termos que no idioma português faltem para traduzir os exóticos”. Castro Lopes não tenta promover reformas apenas na língua portuguesa. Sugere muitas outras. Tem, pronta, uma fórmula para acabar com a dívida interna e externa do país, ou, pelo menos, é o que garante. Tal fórmula apóia-se numa moeda universal, o ponto alto da plataforma com a qual se lançou candidato a deputado provincial pelo Rio de Janeiro. Não se conhece nenhuma adesão de outros países à tal da moeda universal do latinista, mas o fato é que ele se elegeu deputado. Acusem-no, os que quiserem, de purista extremado, mas não o tomem por rabugento. Será um equívoco. Castro Lopes tem um surpreendente bom humor. Daria um excelente cômico se quisesse. Observe-se sua investida contra a palavra peignoir. Não cria, no caso, um neologismo. Vai buscar o vocábulo português que julga correspondente: roupão. Dirigindo-se ao “belo sexo”, Castro Lopes pergunta: “Por que empregareis o termo francês peignoir quando esse traje não serve para o fim que o nome indica?” Logo depois, lança, às damas nacionais, um apelo que revela seu talento humorístico: “Despi, portanto, eu vos suplico, o peignoir francês, e vesti o vosso roupão”.

Se daqui a 100 anos os neologismos do senhor Castro Lopes estarão vivos ou mortos, ninguém pode saber. Alguém usará a expressão “protofonia” como abertura de um ensaio, uma ópera, uma peça? Haverá crianças que peçam aos pais que façam um convescote domingo no parque, em vez de piquenique? Em duas crônicas recentes, o escritor Machado de Assis referiu-se ao trabalho de Castro Lopes com sarcasmo reprovador. O latinista não se intimida. Diz-se à boca miúda que, a cada golpe desferido por um adversário, responde com um toast solitário à cruzada pelo vernáculo - perdão, onde se leu “toast”, leia-se brinde.

Pérolas de um latinista

Como é e como fica

Abajur - Lucivelo ou lucivéu
Avalanche - Runimol
Bijuteria - Joalheira
Boulevard - Calçada
Cachecol - Focale
Chalé - Castelete
Champignons - Cogumelos
Claque - Venaplauso
Debut - Estréia
Engrenagem - Entrosagem
Feérico - Fatídico
Galochas - Anidropodoteca
Massagem - Premagem
Mise-en-scène - Encenação
Nuance - Ancenúbio
Pince-nez - Nasóculos
Piquenique - Convescote
Reclame - Preconício
Repórter - Alvissareiro
Turista - Ludâmbulo

3 comentários:

  1. Respostas
    1. (argento) ... que tal caganol? - tá mais de acordo com a função a que se destinava o utensílio.

      Excluir
  2. Essa do penico - urinol me lembrou de uma piada.

    O gaúcho foi a São Paulo e se hospedou num hotel que não tinha banheiro no quarto, então resolveu comprar um penico para se garantir. Trajado a rigor (pilchado) foi até um armazém próximo, onde haviam penicos pendurados e bem a vista de todos. Mas o gaúcho tinha vergonha de pedir um "penico" na frente do público e não conhecia outra palavra para o utensílio. O gaúcho apontou para o penico e disse para o vendedor:

    G: Eu quero um daqueles.
    P: Um "o que"?
    G: Um daqueles - apontando novamente para os penicos.
    P: O senhor quer um gaúcho?
    G (envergonhado): É, eu quero um gaúcho.
    P: E qual o tamanho do gaúcho que o senhor quer?
    G: Cabendo uns três paulistas dentro já está bom.

    ResponderExcluir